Entrevista: Empreendedorismo Negro, com Maria Rosa, da Arte de Maria.

junho 08, 2020

Foto Maria Rosa, Designer e Colagista por Chapati Imagens
Créditos: Chapati Imagens


Ter uma estabilidade financeira e estruturar uma marca não é uma tarefa fácil, sendo mulher e negra no Brasil, torna isso uma tarefa ainda mais difícil. Com lutas diárias para ser ouvida dentro de uma sociedade racista, machista e em busca de sua emancipação, hoje vamos saber um pouco da história de Maria Rosa, criadora da marca Arte de Maria, uma empresa de papelaria, uma das maiores do segmento papelaria de resistência, que conta, em seus produtos, histórias de luta e resistência de mulheres, principalmente mulheres negras, que foram e são relevantes para nossa luta de emancipação negra e feminina.
Em suas artes retrata com sensibilidade política e estética, personalidades como Dandara, Aqualtune, Conceição Evaristo e outras mulheres da história, da escrita e do cinema.
A marca que conta com mais de 17 mil seguidores no instagram, exibições em programas como o Encontro com Fátima Bernardes, já apareceu em postagens de artistas como Lázaro Ramos e Leandra Leal.

Como surgiu a Arte de Maria? Qual foi sua principal inspiração para decidir criar a empresa? 
Maria Rosa: Quando me formei, busquei reconhecimento como artista, queria que as pessoas conhecessem o que eu faço. Queria que minha arte pudesse fazer a diferença, porém percebi que buscar esse reconhecimento daquela forma não seria possível. Percebi que no mundo das galerias e editais existe muito interesse e eu, sem influência alguma, nunca conseguiria algo relevante e principalmente rentável a ponto de suprir minhas necessidades financeiras de mulher negra periférica que cresceu à margem da sociedade. Naquela época trabalhava como designer para uma empresa e sempre me questionava também o fato de não ter meu trabalho valorizado. 
Sempre pensava que se dedicasse aquele tempo pra promover o que eu faço e amo, ganharia muito mais, pra mim não tinha erro, então decidi criar a marca, unindo amor, informação e emancipação. Aplicando minhas artes em produtos úteis conseguiria o objetivo de levar minha arte até a casa das pessoas, levando com ela também uma informação.
Com a marca levo a representatividade que não tive, conto histórias que tive que descobrir sozinha e falo sobre consciência que devido as minhas limitações sociais conquistei depois de adulta. Tento fazer a diferença, tornando mais acessível esse diálogo.
“Maria” somos todas nós mulheres. Minha militância é por raça e gênero e conto história de mulheres que potencializaram nossa voz ao longo da história. Com grande foco em nós, mulheres negras.


Maria Rosa com caderno argolado Chimamanda Ngozi Adichie, por Chapati Imagens
Caderno argolado Chimamanda Ngozi Adichie ||
Créditos: Chapati Imagens
Quais foram as maiores dificuldades que encontrou durante esse processo? 

Maria Rosa: Sendo uma mulher negra à margem encontrei muitas, a principal é a descredibilidade que a sociedade coloca nas nossas costas. A idéia de que se eu estou vendendo algo feito a mão em alguma feira ou evento, estou “vendendo o almoço pra pagar a janta”. Bati de frente com algumas situações de racismo estrutural também. O fato do meu trabalho ser profissional fazia com que algumas pessoas chegassem a duvidar se era eu mesma que fazia.  
Tem também o fato de que com o tempo, comecei a me reconhecer muito mais e enxergar cada vez mais a necessidade de focar na questão racial e meu trabalho começou a ficar mais representativo, antirracista, e com isso vieram as situações de racismo escancarado, em que pessoas brancas deixavam de comprar dizendo: “é lindo mas eu sou branca” ou “é lindo mas quem vou presentear é branca”, e nunca houve a possibilidade de diálogo nessas situações, se tornando também um fator decisivo para a compra.
 
Qual foi a sua maior conquista dentro da marca? 
Maria Rosa: A emancipação e de fato o reconhecimento como artista. Viver de arte!
Hoje posso dizer que vivo de arte e conquistar isso é uma vitória muito grande pra mim.
Meu trabalho com a marca é minha única fonte de renda e cada evolução pra mim é uma conquista, porque minha empresa também é o meu lado mais íntimo.
 
Você foi exibida no programa Encontro com Fátima Bernardes, conta pra gente como foi? 
Maria Rosa: Quando fui contactada não acreditei rs
Pesquisei pra saber se aquela pessoa que me procurou era real e se realmente trabalhava para a rede Globo. 
Fui encontrada pelo meu trabalho com a Arte de Maria e convidada a ter minha arte exibida no programa durante uma semana. Topei na hora, claro!
É uma conquista que nunca imaginei que conseguiria, ser reconhecida nacionalmente e fazer com que minha família me assistisse em rede nacional, não tem preço!

Como você vê o futuro da sua marca com o passar do tempo? 
Maria Rosa: Os objetivos são bem certeiros. 
Quero crescer e me tornar uma empresa que emprega mulheres minorizadas, quero ser uma rede de apoio e conseguir fazer a diferença para além da informação. 
Sabe a história da Madam C.J. Walker? que além de se emancipar, ajudou tantas outras mulheres pretas a se emanciparem junto? essa é minha missão!

Maria Rosa com caderno argolado Carolina Maria de Jesus, por Chapati Imagens
Caderno Argolado Carolina Maria de Jesus
Créditos: Chapati Imagens

Uma dica para quem tem vontade de seguir os mesmos passos que você:
Maria Rosa: Acredite no seu potencial.

Vão surgir muitos obstáculos e você precisa ser forte e determinada para levantar e seguir mais forte que antes. Você vai precisar trabalhar mais que o normal mas será gratificante se você estiver fazendo o que ama e de coração aberto.

Uma dica técnica é que você precisa ter uma organização extrema, de tarefas e financeira, ter sempre em conta os seus gastos e sempre reveja seu lucro em cima do “valor” do seu trabalho, para ser valorizada você precisa entender qual é o seu valor. Esse cuidado é essencial para que seja sempre rentável e prazeroso.



Entrevista: Gabi Barbosa


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